segunda-feira, março 04, 2013

Por ocasião do papado


O vendedor de ideias

Salomão era decidido no que fazia. Primeiro começou inventando mensagens para concursos de melhores frases. Ganhou passeios, motocicletas, carros e até algum dinheiro. Depois partiu para a área de propaganda e marketing. Não precisou cursar faculdade para se destacar. Era só ter a ideia e partia atrás dos empresários. Não falava com qualquer pessoa, insistia em falar com o manda-chuva. E era só o empresário dar ouvidos a Salomão e a ideia estava comprada. Muitos, num primeiro momento, achavam que perdiam tempo com aquele sujeito cheio de soluções engraçadas e malucas. Mas logo percebiam que ele era um gênio do marketing.

Foi assim com diversas lojas, marcas de eletrodomésticos, móveis, roupas, refrigerantes, entre outras.

Chegou uma época em que ele nem precisava correr atrás, era o contrário.

Salomão, não se sentia mais um qualquer. Tinha prestígio e dinheiro. Quase uma autoridade.

Para ele isso não importava. A satisfação era completa quando via as suas ideias circulando pelo mundo. Multidões de pessoas sendo atraídas por uma mensagem de marketing criada por ele. Às vezes o produto nem era aquilo tudo, mas a propaganda fazia crer que sim.

Foi então que o dono de soluções tão fantásticas resolveu queimar seus neurônios criando propostas para o catolicismo.

Trancou-se em seu escritório durante dois meses. Quando saiu dava pra ver seu contentamento. Tinha criado o maior pacote de ideias para a religião que há muito vinha perdendo fiéis e credibilidade. Estava em seu poder a solução para esses problemas.

E qual não foi a surpresa das pessoas que o conheciam, quando Salomão partiu para o Vaticano em busca de uma reunião com o Papa?

Era ou não era um maluco?

Avisou que só voltaria depois que conseguisse apresentar todas as propostas que tinha criado. E tem mais: não cobraria um centavo pelo serviço. Quando criança aprendeu na igreja que o que vem de graça tem que ser passado de graça. O seu dom era divino, então nada mais justo.

Durante a viagem ensaiou várias vezes a resposta que daria ao Papa se ele insistisse em pagar pelas ideias, tamanha era a sua certeza pela recepção.

E acreditem leitores, não foi difícil de ser recebido pelo representante maior do catolicismo. Bastaram alguns dias de espera.

O fato foi que o nome de Salomão já havia ventado por aqueles lados. E afinal, o Papa era inteligente, não dava pra negar que há tempos a igreja estava precisando de ideias inovadoras.

Para justificar as suas propostas, Salomão fez uma explanação sobre as novas e já velhas práticas das autoridades católicas. Citou padres que são cantores e dançarinos e outros que escrevem livros. Falou dos copos de água em cima da TV durante a missa de domingo e várias outras coisas.

Quando iniciou a apresentação do pacote, disse que a igreja precisava de outras mídias, que tinha de acompanhar o ritmo das pessoas e que o cristianismo precisava de mais praticidade.

- Outras religiões estão ganhando força porque estão se adaptando. Vejam as que atendem os fiéis com hora marcada, em consultórios religiosos, fazem milagres via ondas do rádio, expulsam demônios só por telefone, e coisa e tal.

O Papa e seus subordinados começaram a torcer o nariz. Percebendo a situação, Salomão partiu logo para o ataque que acreditava infalível: abriu sua maleta cheia de ideias e foi projetando-as no telão, explicando-as uma a uma.

Ali tinha a proposta, a forma de colocá-la em prática, e ainda um manual para resolver futuros problemas.

Havia o disque-papa e o tele-padre. Missas relâmpagos para chamar a atenção de adolescentes e jovens nas escolas. E mais: transformar as missas em saraus católicos, fazê-las em academias de ginásticas, instalar telões em avenidas movimentadas, que transmitissem mensagens de Roma, produzir marcas de roupas com os nomes de Deus, Jesus e outros santos.

- Já pensou Vossa Santidade, dois meninos na periferia de São Paulo ou do Brooklin se vangloriando em usar roupas de marcas?

– Joãozinho que marca é a sua roupa?

- Ah, a minha é de Santo Antônio.

- E a minha, que é de Jesus?

Todos se entreolharam.

- E as procissões, Vossa Santidade, os idosos não agüentam mais a caminhada. E os jovens têm preguiça. Porque não iniciar as Prociatas?

O Papa fez cara de quem não entendeu.

- Eu explico – disse Salomão todo empolgado – É uma mistura de procissão com carreata. Hoje em dia quase todo mundo tem carro e os políticos usam muito desses artifícios lá no Brasil. Imagine um padre em cima de um caminhão com microfone e abençoando as pessoas nas ruas. Atrás do caminhão uma fila gigantesca de carros. Muito lindo e imponente não, Santidade?

Em uma das propostas havia a que colocava padres para tomar vinho nos botecos e jogar umas peladas nos fins de semana em campos de várzea. Essas duas últimas eram para completar o pacote de popularização da religião.

Tinha ainda a solução para a camisinha e para o aborto, mas não teve tempo de explicar.

Quase foi chutado dali.

Salomão voltou derrotado para casa. Pensava que suas ideias eram o grande trunfo para o catolicismo, praticamente um furo religioso.

- O catolicismo odeia evoluir. É só ver a época das mudanças, quando a missa era rezada em latim, e depois de muito tempo o padre Antonio Vieira a modificou com seus sermões em português. E somente agora os padres cantam, dançam e lançam livros. – Pensava o vendedor de ideias.

Como era decidido e disposto não iria deixar dois meses de trabalho e dedicação esvaírem-se numa negativa do Papa. Pensou em uma nova investida, só que dessa vez em outra religião.

O conselho nacional de pastores do Brasil não hesitou nem um pouco em implantar as ideias de Salomão. E ele ainda foi o convidado de honra para fazer parte do conselho como membro honorário, só criando ideias para o crescimento e o destaque da religião evangélica.

Salomão se contentou, claro, não era a sua religião, mas o importante estava sendo feito, iria ver mais e mais multidões sendo levadas pelas suas ideias.
 

Sacolinha