segunda-feira, julho 31, 2006

Distorção

Eita jornalismo sacana hein! acesse: www.literaturanobrasil.blogspot.com E leia texto de manifesto contra a matéria publicada na revista Folha de domingo, onde o tema foi centrado nos escritores da periferia.

sábado, julho 29, 2006

Sarau Erótico

Foto: Fernandes Junior
Tuane e Ed Nicodemo do grupo de teatro Neura
Eita que hoje tem Sarau erótico lá no Centro Cultural de Suzano. Tô descendo daqui á pouquinho para decorar o local, já que essa parte ficou pra mim né? Vários são os motivos pra gente fazer esse sarau: 1- o brasileiro não é formiga pra trabalhar 24 horas por dia; 2- um bom lazer é sempre bem vindo; 3- nenhum militante consegue ser revolucionário 24 horas por dia; 4- ninguém gosta de viver em reuniões o dia inteiro; 5- o brasileiro também faz amor, muito amor; 6- divulgar a literatura erótica; 7- trabalhar a prevenção das DST´s. 8- Amor acima de tudo. É isso mesmo, vamos lá na Praça Roosevelt, assistir a mesa de debate da Flap, com os amigos, Ferréz, Vaz, Da Rosa, Du Rap, Zeni e o Bianchi. Depois todo mundo ruma para Suzano, pra tirar uma chinfra. É tudo nosso!

quarta-feira, julho 26, 2006

Fotos no Presídio

Essas fotos foram tiradas pelo Durvalino Peco, mas já avisei pra ele que é melhor desistir da profissão de fotógrafo. É melhor ele continuar cursando biblioteconomia, senão vai morrer de fome. Rssssss.Na sala da penitenciária

Exibição do vídeo

Ao fundo, de camisa azul, Wagner Gasoli, um dos integrantes do Leitura Livre

O grandão é o meu segurança, Durvalino, eu e o Gasoli

terça-feira, julho 25, 2006

No presídio

Olá pessoal. Tô eu aqui postando um breve texto do bate-papo lá no Presídio Semi-Aberto de São Miguel.
Estive lá no domingo de manhã junto com os integrantes do Leitura Livre (que agora mudou pra ativa), Durvalino e Wagner Gasoli. Lá é totalmente diferente dos presídios que já passei dando minhas palestras. Só pra se ter uma idéia, os portões ficam abertos, e os detentos ficam livre para entrar e sair. Vi lá também uma bilbioteca que está sendo montada pelos integrantes do Leitura Livre e sendo administrada pelos próprios usuários.
A palestra
O bate-papo iniciou-se às 10h, com uma conversa be descontraída. Todos interagiram, na sala tinha gente de 19 até 55 anos.
Passei o vídeo-documentário "Literatura no Brasil" que inclusive eles gostaram muito.
Teve depoimentos pessoais, opiniões e idéias durante a conversa. Só queria ressaltar que lá tem gente com faculdade e outros que estão prestes a entrar. Tem um que está se formando técnico em Webdesign.
Finalizamos e eu fiquei trocando uma idéia legal com o Fernando, ex-interno da Febem que está compondo um romance. Trocamos contatos e ficamos de mandar cartas para trocar experiências.
O almoço
Agora só não posso deixar de falar do almoço. Putz grila, nunca comi tão bem na minha vida. Ô comida gostosa, bem temperada, com três misturas, arroz de forno, maiosese, suco e frutas a pamparra. Quase que não consigo levantar da mesa.
Lá também são os próprios presos que fazem a comida.
A administração do Presídio me recebeu muito bem, e agradeço a gentileza.
Logo publico aqui algumas fotos da palestra.

sábado, julho 22, 2006

Fim de férias

Então é o seguinte; está terminando as minhas férias, da facul e do trampo. Estava previsto pra mim ir á Bahia, com palestra marcada e tudo mais, pegar uns contatos, conhecer Salvador e várias outras coisas. Mas infelizmente a grana tava curta, e tive de investir no livro novo. Sem dinheiro mas com muita disposição, aproveitei as férias do jeito que pude: adiantei um monte de coisas, dei um belo rolê em São Paulo, andei de bicicleta á pamparra, empinei pipa, dei umas voltas com os meus primos pequenos, fiz uns bons rolês com a minha noiva, pulei fogueira, comi batata doce assada, entre várias e várias outras atividades de que não precisei gastar muito dinheiro, graças a criatividade desse escritor doidinho da silva. E pra finalizar essas férias, hoje ainda empino mais um pouco de pipa (quando a molecada vê eu colocando pipa no alto eles já tremem na base), á noite vou na festinha de aniversário de 2 anos da filha do Mancha, um camarada que conheci quando vim morar em Suzano. E amanhã estarei dando uma palestra às 10h no Presídio de São Miguel, através do projeto Leitura Livre dos amigos Wagner Gasoli e Durvalino. Depois parto para Barueri na Zona Oeste, na casa da minha noiva. Na segunda de manhã parto de lá para a Praça Ramos, no Teatro Municipal, onde me encontrarei com o poeta Sérgio Vaz e o escritor Alessandro Buzo para uma entrevista à Folha de São Paulo. Á seguir vamos ao Itaim Paulista, onde serão tiradas as fotos para a matéria. Posteriormente vamos tomar um cafezinho, pelo menos eu né? Porque o Buzo e o Vaz, vão de cerveja mesmo. Eita laiá. Aí sim volto lá pra Secretaria de Cultura. E quarta-feira estarei na Cooperifa junto com o pessoal do Literatura no Brasil. É isso!
Esse aí na foto comigo é o meu amigo Moacyr Scliar, ele é quem assina o prefácio do livro 85 Letras e um Disparo, que sai agora em agosto.

sexta-feira, julho 21, 2006

Voltei

Salve, salve pessoal do lado bom. Não morri não, tô vivão. Só o computador que tinha pedido um médico. Mas agora já tá melhor e em casa. Valeu pelas ligações telefônicas.

sexta-feira, julho 14, 2006

Compromisso II

Só pra avisar dessa palestra que não está na agenda. Dia 23/7, domingo, estarei dando uma palestra na Penitenciária Masculina de São Miguel, através do projeto "Leitura Livre". Logo darei mais informações.

O dia de hoje

Crônica de um dia não anunciado! Eita que tô todo atolado. Hoje, sexta cedo, o meu computador inventou de dar problema. Ai, ai, ai, ai... E eu com um monte de coisas pra fazer. Diagramar a revista Trajetória Literária II (que aliás, vai vir com ótimos autores), fazer uns três relatórios de eventos, escrever o prefácio do livro do Alonso Vieira, fazer umas articulações pro lançamento do meu 2° livro e outras coisas mais. Porém, o pior ainda estava por vir. Peguei o meu carro e fui levar o computador ao técnico, e foi aí que o "fio da puta" do carro também quebrou. Porra, e logo agora que eu tô pagando a gráfica que tá rodando o meu livro? Joguei o safado lá no mecânico, aproveitei e já pedi para ele revisar tudo, e só me ligar quando o carro estiver beleza. Já que tô de férias do trampo, só dei uma passada aqui pra atualizar o blog e articular uns e-mails. Ah, e não percam, no domingo tem o Conduta na Rua, evento do meu amigo Buzo, mais informações acesse: www.suburbanoconvicto.blogger.com.br Abraços á todos.

quarta-feira, julho 12, 2006

+ indicação

Dessa vez é livro. Pessoal, preciso indicar, o cara é foda, os escritos dele é coisa maravilhosa... falo de Charles Bukowisk, o chamado velho safado. Já li "Cartas na rua", "A mulher mais linda da cidade" e "O marinheiro saiu para almoçar e os navegantes tomaram conta do navio". Eita, esse último título tá mais prum mini-conto. Assim que eu pegar uma grana vou colar nuns sebos por aí e fazer a limpeza dos livros do Bukowisk. E os que faltarem eu compro nas bancas do centro de Sampa, naquelas estantes giratórias, tem um monte de livros dele, relançado pela L&M Pocket. Camarada, não morra antes de ler pelo menos uma obra desse velho beberrão, safado, prostituto e os escambaus. O cara é bom demais. Quando crescer quero ser igual ele.

terça-feira, julho 11, 2006

Bem vindo

Saudações literárias! Seja bem vindo neste blog, onde publico meus textos, meus compromissos, fotos, opiniões e notícias do meu dia-a-dia, além das minhas neuroses. Quem quiser mandar algum texto literário para ser publicado no blog abaixo: http://www.literaturanobrasil.blogspot.com/ manda no endereço: http://literaturanobrasil@bol.com.br/

Fotos

Eu, Loyola Brandão e Walmir Pinto (Secretário de Cultura Suzano)

Novela

Saudações, Tô passando aqui só pra fazer uma indicação... Trata-se da novela "Mandacaru" (esqueci o nome do autor). Novela que fala um pouco do cangaço, da Bahia, da sua cultura, do cordel, e o dia-a-dia dos moradores do interior da grande e populosa Bahia. Os atores e atrizes são muito bons. Vale a pena, até porque é reprise. Uma novela não recomendada para menores de 14 anos, por isso ela passa após às 22h. Serviço: Novela Mandacarú TV - Band - Canal 13 Horário: 22h

Entrevista

E segunda-feira (10/7) o povo do Rio de Janeiro poderá escutar a entrevista que darei para a jornalista Renata Ximenes, ao vivo e por telefone, às 12h45min. Serviço: Rádio Roquette - 94,1 Ouça pela Internet: www.fm94.rj.gov.br mailto:radio94fm@gmail.com Telefone: (21) 2533-5727

Compromissos

Agenda de julho 03 – segunda 13h: Reunião c/ Secretaria Municipal de Saúde 19h: Oficina de Dramaturgia Centro Cultural de Suzano 04 – terça 17h30: Reunião da Associação Cultural Literatura no Brasil 19h: Oficina Literária: Literatura brasileira de autoria Feminina Centro Cultural de Suzano 06- quinta 19h: Oficina Literária: Literatura brasileira de autoria Feminina 20h: Lançamento do livro “Versonhos” – Cícero Tavares e Renata Pinheiros Centro Cultural de Suzano 08 – sábado 20h: Pavio da Cultura (Sarau) Centro Cultural de Suzano 10 – segunda 19h: Oficina de Dramaturgia Centro Cultural de Suzano 14 – sexta 20h: Abertura da Semana da França Centro Cultural de Suzano 17 – segunda 19h: Oficina de Dramaturgia Centro Cultural de Suzano 18 – terça 17h30: Reunião da Associação Cultural Literatura no Brasil 24 – segunda 19h: Oficina de Dramaturgia Centro Cultural de Suzano 26 – quarta 19h: Palestra na Ong Bem Viver Bairro Piratá – Poá – S.P 28 – sexta 20h: Samba e Poesia Casarão das Artes – Suzano 29 – sábado 20h: Pavio erótico (Sarau) Centro Cultural de Suzano 30 – Domingo 14h: Circuito Hip Hop Escola Oswaldo de Oliveira Lima Jd. Revista – Suzano – S.P 31 – segunda 19h: Oficina de Dramaturgia Centro Cultural de Suzano

Sobre mim

Currículo/Biografia Ademiro Alves de Sousa (São Paulo – S.P - 1983). Sacolinha, nome artístico de Ademiro Alves de Sousa. Graduando em Letras na Universidade de Mogi das Cruzes. TRAJETÓRIA 2002: Março: Começa a pegar gosto pela leitura. Junho: Começa a escrever. Dezembro: Cria o Projeto Cultural Literatura no Brasil. 2003: Setembro: Recebe Menção Honrosa no 2° Concurso “ARTEZ”, com o conto urbano “Um dia comum”. 2004: Abril: Começa a escrever o seu primeiro livro. Maio: Participa da revista Caros amigos "Literatura Marginal" ato III. Outubro: Participa da coletânea “ARTEZ” vol. V - Meireles editorial. Novembro: Termina a produção do seu primeiro livro. Dezembro: Assume a presidência do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Sócio cultural Negro Sim. Escreve o conto “Pacífico Homem Bomba” que foi adaptado para o teatro. Participa da Antologia “No limite da palavra”; editora Scortecci. Participa da antologia poética: “O Rastilho da Pólvora” do Projeto Cooperifa, (Cooperativa Cultural da Periferia). 2005: Janeiro: É convidado para assumir a Coordenadoria de Literatura na Secretaria Municipal de Cultura de Suzano – S.P. Março: Assume oficialmente a Coordenadoria Literária em seu município. Abril: Seu estilo literário começa a ser estudado em três universidades: USP- Universidade de São Paulo. UMC- Universidade de Mogi das Cruzes. Anhembi Morumbi. Agosto: Lança o seu primeiro livro. O romance contemporâneo “Graduado em Marginalidade” em Suzano, São Paulo. Lança o “Graduado em Marginalidade” em Cambuí, Minas Gerais. Setembro: Escreve o Posfácio do livro “O trem – Contestando a Versão Oficial”, do escritor Alessandro Buzo. Outubro: Começa a vender livros nas noites de São Paulo. Inicia a produção do seu segundo livro: “85 Letras e um Disparo”. Novembro: Produz o Vídeo-documentário do Projeto Cultural Literatura no Brasil. Dezembro: Lança em parceria com a Prefeitura de Suzano, a Revista “Trajetória Literária”, que reúne 20 escritores inéditos. Participa do livro Cadernos Negros vol. 28 – Contos Afro-Brasileiros. Recebe o “1º Prêmio Cooperifa” juntamente com outros escritores. Funda oficialmente a Associação Cultural Literatura no Brasil, antes com o nome de “Projeto Cultural Literatura no Brasil”. 2006: Janeiro: O romance “Graduado em Marginalidade” é indicado para participar do Prêmio Jabuti como melhor livro de 2005. Fevereiro: Ingressa no Curso de Letras da Universidade de Mogi das Cruzes. Março: Finaliza a produção do seu segundo livro, “85 Letras e um Disparo”. Abril: Inicia sua carreira de dramaturgo, escrevendo a peça de teatro: “Toque de recolher”. Começa a produzir o seu terceiro livro, o romance “Barril de pólvora”. Escreve o conto “Devaneio” para a “Revista Palmares” – Cultura Afro-Brasileira nº 2 da Fundação Cultural Palmares – Governo Federal. Sacolinha é ativista cultural. Faz palestras sobre literatura e questão racial; desenvolve freqüentemente eventos literários. Contato: (11) 8325-2368 Fone/Fax: (11) 4747-4180 E-mail: sacolagraduado@bol.com.br Blog/Site: http://www.literaturanobrasil.blogspot.com/

Vem aí...

capa do meu 2º livro
Este texto vai fazer parte do livro "85 Letras e um Disparo". Enquanto não chega o dia 08 de agosto, vai lendo aos poucos, em pequenas doses.
Yakissoba
Cheguei cedo naquele dia. As contas já estavam atrasadas e a geladeira, vazia, há muito vinha pedindo alimento. Precisava vender no mínimo uns quatro exemplares do meu novo romance. Desembarquei no metrô Consolação às 20h. Segui sentido metrô Brigadeiro. No caminho ia parando nos botecos e, com um jeito educado e brincalhão, sentava nas mesas e oferecia o exemplar: um “não” aqui, outro “não” ali... Nada de errado, o começo é assim mesmo. Cheguei ao final da avenida Paulista. Passei para o lado contrário. Bom, pelo menos ali haviam duas universidades; poderia rolar algumas vendas. Estudantes instruídos, adeptos da leitura, acostumados a comprar livros de alto custo... Era o lugar certo. Na primeira universidade os estudantes estavam em intervalo; alguns conversavam sentados no escadão, outros namoravam em frente à lanchonete. Ensaiei algumas palavras e rumei para o escadão. Trinta abordagens. O resultado foi a minha saída de cabeça baixa daquele recinto. E se elogio fosse dinheiro sairia dali de bolso cheio. A fome começou a roçar o meu estômago. Só haviam dez reais na carteira e com isso eu não conseguiria comer nem o churrasco vendido na calçada, já que o ditado capitalista diz: “Quem anda pela Paulista é quem tem dinheiro”. Pobre de mim. Passando em frente à segunda universidade, abordo três estudantes. Apenas um deles me dá atenção, enquanto os outros dois se entretém tirando fotos com o celular. Depois de ler a orelha do livro, o rapaz de voz efeminada agradece e diz que está sem dinheiro: - Nós somos estudantes camarada; estudante não tem grana. Saí resmungando: “Não têm dinheiro, mas ficam trocando fotos entre os celulares”. Continuei curtindo caminhada até o início da avenida, onde hoje está o Cine Belas Artes. Entrei num bar e fui até o banheiro esvaziar a bexiga. Na saída fiquei paquerando uma empada toda murcha e cheia de rugas. Não podia gastar o pouco que tinha no bolso e, se fosse pra comer alguma coisa, que comesse mais tarde, na hora em que não desse mais para continuar de pé. Qualquer bolacha dá pra enganar o estômago. Uma nova abordagem: - Licença e boa noite. Podem contar no relógio, não irá passar de um minuto. Eu não quero encher o saco de vocês. A recepção nada me alegrou, mas continuei: - Sou o fulano de tal e sou escritor, autor deste romance... Enquanto as quatro pessoas folheavam o livro eu ía puxando a sardinha para a minha brasa: - Já lancei no Rio de Janeiro, em Minas, no Ceará e semana que vem estarei indo lançá-lo na Bahia. Nenhum deles dava atenção ao que eu dizia. Um outro desistiu de continuar folheando e deu um gole na cerveja. Apesar do barulho dos carros a passando pela avenida, consegui ouvir o som da cerveja descendo na goela do rapaz. Eu, que odeio cerveja, de repente senti uma grande vontade de beber uma. Era a sede que junto com a fome conspirava contra o meu organismo. Tentei mais um apelo: - Esses são os últimos exemplares da terceira edição. A simpatia tomou o lugar das caras fechadas. Ouvi os seguintes comentários: - Parabéns pela obra, mas estou sem dinheiro. - Muito bonito esse livro. Mas você apareceu num dia ruim. - Vai ficar pra próxima. Boa sorte nas suas vendas. Pensei comigo: “Vendas, que vendas”? Segui cantando: “Ando devagar por que já tive pressa e levo o meu sorriso, por que já sofri demais...” Encontrei um boteco com muitas mesas. Um som ambiente alegrava as pessoas no local. Estudei os trajes e me aprumei nas conversas. - Livro isso, livro aquilo... - Se nós pensarmos que a reciprocidade da coisa... - Houve muita redundância na Semana de Arte Moderna... Ouvindo esses diálogos meus olhinhos brilharam. Finalmente iria vender uns livros. Primeira mesa: não. Segunda: você está por aqui todo dia? Terceira: vamos deixar pra depois por que hoje a grana tá curta. Quarta: Parabéns pela sua coragem. E assim seguiu em todas as mesas. Não consegui me conformar. Ainda houve um momento em que um senhor com sua amante me disse: - Depois de amanhã eu pego; agora só tenho dez reais para abastecer o carro e chegar em casa. Enquanto ia me retirando o garçom trazia na bandeja o troco do senhor: trinta e cinco reais. Saí balançando a cabeça. Já iam dar dez horas e nem uma venda. Puta que pariu. Tinha que pensar numa nova estratégia; já menti, usei do exagero, aumentei os fatos e nada. Nem no cheque consegui venda. E a fome à bailar em meu estômago. Comecei a prestar atenção naquele macarrão dos japoneses. Sempre havia alguém em volta do carrinho comprando aquilo. Olhei a placa dos preços: Pequeno: R$ 2,50 Médio: 4,00 Grande: 6,00 Nessas alturas necessitava de no mínimo duas porções grandes. Venci a tentação e segui cogitando alguma venda. Quem sabe lá na frente não acho uma barraca de doces. Assim faço um lanche com três reais: é um suco e dois pacotes de bolachas. Andei. Parei. Andei. Parei. Nada de vendas e nada de barracas. Passei novamente para o outro lado. Avistei um homem vendendo amendoim em cima de uma lata que servia de fogareiro. O mantimento vinha dentro de um pequeno cone. Chamei o vendedor e enquanto perguntava o preço ia procurando moedas no compartimento da carteira. - Um real e cinqüenta, meu companheiro. Preferi não negociar. O cara teve a cara de pau de me cobrar um e cinqüenta numa pequena porção de amendoim, digna de mesa de boteco, e ainda me chamar de companheiro. Ah, vai tomar no cu! Saquei a minha preciosa nota de dez, peguei o troco e sai mastigando amendoim desesperadamente. Mais à frente, uma senhora me pára pedindo um vale-transporte. Falo que sou escritor e que estou vendendo meus livros. Quando vou mostrar um exemplar ela vira as costas e sai rapidamente. Solto uma risada frouxa. Continuo na peregrinação. O amendoim só aumentou mais o incômodo na barriga, despertou a dormência que amenizava a fome. Bebi água morna numa padaria, o estômago doeu ao receber o líquido. Parei na porta de uma famosa loja de hambúrgueres e kibes; analisei os valores. Nada que o meu dinheiro pudesse comprar. Para meu consolo lembrei de um conhecido que quando trabalhava numa dessas lojas, costumava cuspir dentro do pão e passar o queijo geladinho em sua testa. Cheguei na consolação. Prometi pra mim mesmo que só iria dar mais uma volta, quem sabe não estouro algumas vendas. O negócio é persistir. E lá fui eu, rumo aos vários “não”, sentindo o fracasso daquela noite calorenta. Agora andava devagar, parecia estudar os passos. A minha situação não me deixava avançar como antes. As pessoas que passavam por mim seguravam seus pertences. Comecei a cantar procurando desviar a atenção de tudo: da fome, das pessoas com medo de serem roubadas, da polícia que passava na viatura a me encarar, dos mendigos que se preparavam para dormir e dos “não” constantes. Só não conseguia desviar a atenção de uma coisa: daquele macarrão que os japoneses produziam na beira da calçada. O cheiro acariciava as minhas narinas. Nunca comi esse tipo de comida japonesa. Imaginei comê-la naquele dia, assim matava a fome e a curiosidade. Pensei em parar no próximo japonês. Caminhei, caminhei e nada. Cheguei no final da avenida Paulista e passei para o outro lado. Quando encontrei um, esse já desfazia a barraca. Notei o resto de macarrão dentro de duas sacolas. Senti nojo, mas nada que tirasse a minha vontade em encontrar um próximo “macarronês”. Num certo momento da minha caminhada comecei a ter ilusão. Via barracas e barracas lotadas de orientais. Esfreguei os olhos e sentei por um instante. Acho que a fome está me deixando louco, preciso de algum alimento urgente. Levantei e andei sem parar, com a mochila cheia de livros castigando as costas. Muitos japoneses haviam ido embora. Fui achar uma barraca de macarrão quase no início da avenida. A placa estava com valor diferente: Pequeno: R$ 4,00 Médio: 6,00 Grande: 8,00 Protestei comparando valores. O japonês falou que o preço dele era aquele mesmo e que a essa hora só havia sua barraca. Preferi não discutir: - Me dá um macarrão pequeno. - Isso no é macarron, é yakissoba. - Tá bom, me dá isso aí logo. Pra não rolar desconfiança, paguei e fui me sentar no degrau de uma agência bancária que havia em frente. O tal macarrão sumiu em um minuto. Não pensei duas vezes, já estava fodido mesmo: - Dá mais outro aí. Esse deu para mastigar e amenizar a fome. Até que é bom o macarrão japonês. Terminei de mastigar e resolvi ir embora. Lá na periferia eu vendo mais livro do que aqui. Passei meu último bilhete na catraca do metrô. O dinheiro na carteira só não havia zerado por causa dos cinqüenta centavos do troco do amendoim. Troco que gastei na baldeação no Brás (metrô/trem) comprando um suco feito com água do banheiro feminino. Sei disso por que trabalhei três anos ali e via as mulheres entrarem e saírem do banheiro com baldes de água; todas as barracas daquela estação não são abastecidas com água encanada. Sentei na escada, num local onde dava pra ver a chegada do trem. Na hora em que o danado encostar vou me agarrar a porta, tenho que sentar de qualquer jeito, o meu corpo está dolorido ao extremo. Como é bom sentir a barriga cheia... Oh maravilha. Na próxima vez já vou levar o dinheiro do macarrão separado. Será que o tal de yakissoba é tão bom assim ou é por que eu estava com uma maldita fome? O trem chegou. Desci a escada quase quebrando as canelas e fiquei em frente a uma porta aguardando a sua abertura. Odeio fazer isso, mas hoje eu preciso. Corri, mas só sobrou um banco que é destinado aos velhinhos. Olhei para as cabeças procurando a branquidão dos cabelos. Não vendo nada parecido sentei-me e disse em pensamento: “Ninguém tasca”. Dei mais uma olhadela para me certificar. Tudo gente nova; os idosos já estavam sentados. Se entrar algum tiozinho ou tiazinha numa outra estação eu levanto. Num quero encrenca, odeio gente barraqueira, e no trem está cheio delas. Inclusive quando o vagão está lotado e eu estou de pé. Procuro ficar de frente pra porta e de costas pros passageiros. É você encostar na traseira de alguém e ser acusado de estuprador. Aí tome porrada. Abri o romance do Graciliano Ramos e quando estava me entrosando na leitura, o trem chega na estação Tatuapé. Vejo uma mulher entrando e começo a observá-la. Tem umas rugas e uns pés-de-galinha no rosto. Julgo que tenha os seus quarenta e tantos anos, mas parece mais idosa. Levanto-me rapidamente e dou lugar. Ela parece resistir, mas vendo o banco livre, agarra-o. Nem me agradece. O rosto começa a mudar, creio que está ficando com raiva. Saquei a dela e resolvi ir para o fundo do vagão. Vaidosa como todo brasileiro, simplesmente devia estar se perguntando se é velha demais para um jovem oferecer lugar a ela. Sento no chão e me envolvo na leitura. Depois da última baldeação em Guaianases, o trem me deixa no meu município. Sem grana, e à essa hora, sem ônibus, vou a pé pra casa. No caminho tenho a infelicidade de ser abordado pela polícia. Intimamente dou risada; lá na Paulista eu é que abordava, aqui me abordam. O policial que olhou dentro da mochila perguntou se eu era livreiro: - Sou livreiro, editor, escritor, vendedor, modelo da capa do meu livro... Ele deu risada. Perguntou o que eu fazia aquela hora na rua: - Estou vindo da labuta. Estava em São Paulo tentando vender algum livro. - E conseguiu? – Perguntou um outro policial. - Que nada, lá só tem leitor de rótulo de cerveja. Ao término da abordagem me ofereceram carona. Agradeci e fui caminhando. Chegar em casa de viatura não dá. Qualquer hora do dia ou da noite tem algum vizinho vigiando a vida alheia. Aí quando o dia raiar é só fofoca: - O filho da dona Cleide tava aprontando, chegou de madrugada na mão da polícia. E vai saber qual é a dessas autoridades; tem dia que já chegam dando tapa na cara. Num dá pra confiar. Cheguei em casa e me aliviei do peso da mochila; quem disse que cultura não pesa? Olhei nas panelas e na geladeira; não há nada que me interessa. Também, depois dum macarrão daqueles... Tomo um banho e escovo os dentes. O sono está igual galinha sendo cercada no terreiro: vem, não vem. Deito no sofá e volto ao Graciliano Ramos. Minutos depois adormeço com o livro em cima da barriga e o pensamento no macarrão da Paulista.

Informes

Clique aqui embaixo para conferir a última palestra que eu ministrei no presídio: http://www.fespsp.org.br/noticias/72noticia-010506-20h.htm E aqui para ver outra importante matéria sobre falta de recursos, feita pela amiga Carol Landulfo, estudante de jornalismo na ECA-USP. http://www.eca.usp.br/claro/letras.html Mais sobre a palestra no presídio: http://www.funap.sp.gov.br/news_48.html Para palestras, eventos e contatos no geral: Fone: (11) 4749-5744 Fone/Fax: (11) 4747-4180 Cel: (11) 8325-2368 e-mails: sacolagraduado@bol.com.br sacolagraduado@gmail.com MSN: sacolagraduado@hotmail.com Endereço postal para correspondência: Rua Guarani, 413 Jd. Revista – Suzano – S.P CEP: 08694-030

Primeiro Conto

Esse que segue abaixo foi o meu primeiro conto, escrito em 2002 quando eu ainda estava iniciando na escrita. "Um dia comum" foi premiado no Concurso Artez de Literatura, e em 2004 os direitos autorais dele foram adquiridos pela editora Casa Amarela e publicado na revista Caros Amigos Literatura Marginal - Ato III.
Um dia comum
Terça-feira, três horas da matina. O relógio desperta. Tércio se levanta, cala o barulho estridente e sai cambaleando pela cozinha bêbado de sono, antevendo uma nova jornada de sofrimento. Vai começar tudo de novo. São três horas e trinta e cinco, faltam apenas cinco minutos para o ônibus passar rumo à estação de trem de Suzano. Tércio olha em cima da mesa e vê o copo de café lhe esperando; como num passe de mágica engole o líquido preto que sobrou do dia anterior. Com muita pressa coloca a mochila nas costas e vai até o quarto onde dorme juntamente com seus irmãos e sua mãe. Pede a benção para a mesma e afaga as cabeças dos irmãos, cabeças onde trafegam sonhos do mundo mágico do Beto Carrero. Na seqüência faz o sinal da cruz, abre a porta e se lança de encontro ao seu destino. Três e trinta e sete. Pisando no escuro da viela de terra batida, Tércio só consegue naquele quase breu, divisar a fúria faminta de alguns vira-latas lutando com os sacos de lixo que se acumulam na noite fétida. Sobe a rua da sua casa rapidamente e depois desce a rua da escola Filomena Valadares, que desemboca na avenida Fittipaldi. Na cauda da noite, ele observa o ônibus passando. O motorista lhe conhece, Tércio levanta as mãos acenando para que a salvação o veja, pois não pode perder essa condução de jeito nenhum... Opa, parou. Ao entrar no ônibus da Viação Sujeira, ele deseja um bom dia ao motorista, ao cobrador e a alguns passageiros conhecidos. Três e cinqüenta e cinco. A fila pra passar na catraca da CPTM está enorme devido à falta de troco. Os passageiros reclamam da demora porque o maquinista não espera. Na vez do Tércio a mulher do caixa resmunga, por ele ter pago a passagem só com moedas de dez centavos. Ele não se contém: - Tem dia que vocês estão fazendo campanha pra conseguir moeda que usam até bala pra tomar moeda da criançada, e sempre que eu pago com moeda vocês reclamam. E, além disso, vocês não devem escolher se é moeda ou papel, o importante é que o dinheiro está aí, um e cinqüenta e cinco. Simplesmente a mulher fecha a cara e de longe os guardas lhe encaram com olhares ameaçadores. As três e cinqüenta e nove, o guerreiro sobe a escada da passarela que, de tão velha, está enferrujada e até balança com o corre-corre do pessoal que vai embarcar no trem. Com três minutos de atraso a Maria fumaça parte da estação de Suzano, deixando o município para trás. Dentro do vagão nada foge à rotina de sempre. Mulheres falam do último capítulo da novela, homens discutem futebol, alguns jogam baralho, enquanto outros limpam os bancos sujos de pó, serve qualquer coisa; papel higiênico, guardanapo, flanela, toalha de rosto, etc. Neste vagão também se agrupam pessoas que formam a ADF, (Academia da fofoca), onde o grupo se reúne para falar desde assuntos mesquinhos, até assuntos polêmicos, em geral da vida alheia. O trem sacoleja ao ritmo dos barulhos nos trilhos. Neste momento Tércio está com os olhos fixados na vasta escuridão de fora do trem. Não olha pra dentro porque já está habituado a ver rostos que traduzem a pobreza, e cabeças pendendo de sono no ombro do passageiro ao lado. Tércio que não só tem o perfil, como também é morador de periferia, saiu da casa da sua avó, em Jundiapeba onde morava, para tomar conta de seus irmãos e da sua mãe. Desde que seu padrasto desaparecera, ele ficou sendo o chefe da casa onde seus irmãos têm entre onze e doze anos, e a sua mãe, que com quarenta e um anos de idade, não consegue arrumar um emprego, se entregando assim, para os bicos em casa de madame nos finais de semana. Quatro e vinte e cinco; o maquinista abre as portas para a sofrida baldeação. A correria é total. Após todos se acomodarem, o precoce chefe de família sai do velho trem e passa para o tal de “Expresso Leste”, mais conhecido como trem espanhol, que as quatro e meia sai da estação, deixando o guerreiro no seu destino às quatro e quarenta. Tércio agradece á Deus pelo jacaré de ferro não ter quebrado, como é de praxe. Lá fora o patrão lhe espera. Ele desce a escadaria do metrô Itaquera, entra no carro e o “bom dia” soa automático nos ouvidos. A ‘porschet’ está na cintura, a garganta afiada. No primeiro ponto, Tércio que ganhara o apelido de Murphy, por ser muito parecido com o ator americano Eddie Murphy, grita o itinerário da linha de lotação em que trabalha: - Simbora Iguatemi aí ó, Cidade Tiradentes, lugar sentado, quem vai? A esta hora da manhã, sol nascendo, primeira viagem; entra apenas um passageiro, é um dos frentistas do posto de gasolina da estrada Jacú-pêssego. Cinco da manhã; a lotação em que Tércio trabalha chega no ponto final onde estão apenas os carros, os motoristas e cobradores estão dentro da padaria, tomando um cafezinho. Cinco horas e quinze minutos; a fila começa; as kombis, vans, sprinters e microônibus são puxados para frente pelos cobradores; quando o carro enche, o motorista vem. Duas horas da tarde. Onze viagens, Murphy cumpriu sua missão. Agora vai para o segundo tempo: Pegar novamente o trem da tristeza que neste horário já vem lotado da estação do Brás. Ao entrar no espanhol, Tércio faz um giro com a cabeça para ver se encontra algum conhecido: homem, mulher, senhor, senhora, o que importa é passar o tempo. Já que não reconheceu ninguém, abre a mochila e pega o livro “Quarto de despejo – Diário de uma favelada, de Maria Carolina de Jesus”. Abriu onde estava a marca-página, na folha de número quarenta e cinco. Ele agora viaja dentro de outra viagem. Depois de toda a monotonia, o caixão de ferro chega em Suzano. O guerreiro fecha o livro na página setenta e seis. Agora se prepara para a caminhada de quarenta minutos até a sua casa. No meio do caminho uma voz conhecida: - E aí Murphy! Ele que nesse momento folheava um fanzine tirou a atenção do mesmo. Olhando na direção de onde havia surgido o grito, avistou com as mãos cobrindo-lhes os olhos, uma sombra em cima da bicicleta. O sol estava estalando as folhas secas. Na bicicleta estava o seu camarada de longa data, o Rogerinho. Tércio se aproxima e inicia o diálogo: - E aí parceiro, está indo trampá? Depois de uma breve conversa, Rogerinho sai pedalando e Tércio sai andando. Já na rua da escola, Murphy se encontra com seus camaradas da EDD (Esquina Da Diretoria), uns jovens com idades entre dezessete e vinte e um anos, que se reúnem toda sexta e sábado à noite numa esquina do Jardim Varan e envolta de uma fogueira ficam falando dos fatos que ocorreram na semana. Entrando em casa ele ouve a voz do vizinho embriagado que discute com a esposa. Neste momento um certo desgosto toma conta do semblante de Tércio, apesar desta cena ser constante nesta vizinhança. Os seus irmãos estão na escola e sua mãe foi procurar emprego. Ele troca de roupa; o estômago perturba, quer algo para cobrir-se. Tércio abre a geladeira; só tem garrafa d’água e um pé de alface. Ele pega algumas folhas da verdura, picota a moda da casa e faz uma salada que só quem é pobre sabe fazer. O arroz e o feijão estão no prato. Ele agradece á Deus e começa comer. De dentro e casa ouve-se alguém chamar. Vai atender. Sai pra fora e olha pra cima do barranco. O sol forte reluz no seu rosto. A única coisa que consegue enxergar é algo negro e pequeno. Identificou pela voz que gritava: - Ô Murphy, chega aí. Essa voz é do Rafael, um menino de dez anos que vive dizendo aos outros que quando crescer vai ser igual ao Tércio: Perueiro, ter uma mina firmeza, cantar rap e se dedicar a ajudar quem precisasse, (a inspiração é de quem está mais perto). Sempre que Tércio conversa esse assunto com Rafael, ele diz ao menino: - Você pode ser igual a mim, mas não precisa fazer necessariamente o que eu faço, e sim algo melhor, está me entendendo? Ele chama Rafael pra descer e o mesmo diz: - Não vai dar mano, é que eu estava empinando pipa lá em cima da minha laje e vi você chegando, aí amarrei a linha no ferro da coluna e deixei a pipa no alto sozinha. Vim entregar esse livro e pegar outro. Alegre e empolgado, Murphy entra e pega em cima da cômoda o livro “Nó na garganta da escritora Mirna Pinsky”, uma obra infantil que tem como personagem principal uma menina negra e pobre, que em busca de um lugar ao sol encontra a sua verdadeira identidade. Rafael entrega o livro que já leu e sai abraçado com o outro dizendo: - Depois que eu ler eu trago de volta. Novamente dentro de casa o guerreiro olha em cima da mesa; a comida lhe espera, está fria, mas dá pra engolir. Quatro e vinte e cinco da tarde. As mãos lhe doem devido ao esforço que fez para tirar pasta de dente do tubo, que agora, esquecida no canto da calçada de terra, aguarda o caminhão de lixo. Neste momento Tércio irá fazer o que mais adora. Senta à sua escrivaninha, (mesa da cozinha) e se concentra. Uma nova letra de rap começa á surgir no caderno velho de capa rabiscada que ele usou na escola o ano passado. Haja tinta de caneta. Cinco e quinze. Murphy toma banho e vai para o curso, que é ás sete da noite, mas vai no sistema “táxi-sola”. Chega no centro de Suzano ás seis e quarenta e cinco. Na porta do curso conversa com uns colegas. Quinze minutos depois, estão entrando na sala. Agora Tércio se concentra apenas na aula. O professor não quer saber se o aluno aprende ou não, ele está ganhando do mesmo jeito. O pior é que Tércio é o único da sala que ganhou o curso totalmente de graça, num sorteio que teve quando ele cursava o terceiro colegial. Aí é que eles não querem saber mesmo. Dez horas. Este é o horário que Murphy sai do curso. A caminhada até a estação é de dez minutos. No meio do caminho a polícia implica com ele. Lá no morro já estão lhe chamando de breque da rota. Estão em quatro; uma mulher e três homens. O cabeça do grupo começa o interrogatório desnecessário: - Ô vagabundo, isso é hora de estar na rua? Cadê o bagulho? Onde você estava? Está indo pra onde? O que você faz? Nisso já fazem a revista. Um dos policiais pede para Tércio abaixar os braços e olhar para ele. Ao virar o guerreiro vê alguns boys e patricinhas que estão saindo de uma faculdade que tem ali no centro; alguns dão risadas, outros fazem comentários. Neste momento as pernas de Murphy praticam a dança do medo. Ele olha dentro da viatura e vê um policial que está com a arma apontada em sua direção. A policial lhe encara, está esperando Tércio olhar feio, dar motivo para ela começar o seu sermão de coitada: - O que que você está olhando porra? Só porque eu sou mulher você acha que eu não dou conta; posso te pegar sozinha que faço o serviço. Ou senão faço você amanhecer num terreno baldio com a boca na terra. O guerreiro não diz nada. Depois de uma grande canseira eles liberam Tércio, mas deixam um recado: - Se a gente ver você por aqui outra vez, o bicho vai pegar. Sai correndo seu preto do caralho. A vítima saiu dando passos apressados e perguntando para si mesma: - Será que estas apostilhas e esta camisa com o slogan do local onde faço curso, não significam nada pra eles? Em pensamento agradece as pessoas que passaram no local durante a cena; sabe que se não passasse ninguém ali, com certeza neste momento estaria dentro da viatura ou no meio do mato levando borrachadas. Olha no relógio, os ponteiros indicam dez e trinta e três. O ônibus que passa próximo a sua casa já foi, o outro é só daqui a quarenta e sete minutos; se ele for a pé chegará primeiro. Dez e quarenta e cinco. Os passos de Murphy são rápidos, está olhando para frente, pra trás e para os lados. Outra viatura está passando por ele, os donos da noite o encaram de cima a baixo, mas saem em disparada. Ou perceberam que Tércio estava vindo do estudo, ou estavam com assuntos mais importantes. Faltando cinco minutos para Murphy chegar em casa, ele passa na frente de um boteco de luxo que tem ali no morro, e... Adivinha quem está lá? Exato. A viatura que o encarou há alguns instantes. Estão do lado de fora, atrás da viatura, conversando com o dono do bar, que em seguida passa algo para as mãos deles; olham para Tércio, e esse finge que não viu nada e acelera o passo. Onze e dez da noite. Agora o guerreiro está descendo a escada de terra da sua casa, olha pra cima e vê a viatura passando. Entra em casa e tranca a porta. Sua mãe dorme depois de um longo dia à procura de emprego. Seus irmãos fazem o mesmo. Murphy coloca os materiais em cima da cômoda próximo aos livros. Troca de roupa e escova os dentes. Coloca para despertar às três horas da manhã, apaga as luzes, deita no depósito de cansaço e entra em contato com Deus: “Obrigado meu Deus. Muito obrigado pelo pão, pela casa e pelo trabalho. Obrigado por minha família, minha namorada, por perdoar os meus pecados, pela saúde e pelo sorriso dos meus irmãos. Pela escrita, o papel, a caneta e a consciência. Muito obrigado. Eu gostaria de pedir ao senhor, mais um dia, mais uma chance, mas que seja feita primeiro a sua vontade. Deus, apenas mais um dia, um dia comum”.
Sacolinha

Indicações

Sites onde você encontra meus textos: www.enraizados.com.br/ www.literaturanobrasil.blogspot.com www.recantodaspalavras.com.br/autores/sacolinha www.leialivro.com.br/ www.imprensalivre.net/ www.usinadaspalavras.com/ www.capao.com.br/ www.rapnacional.com.br/