quarta-feira, janeiro 28, 2009

Eu respondo

Pediram para eu responder:
Pra mim, o que é (ou poderia, deveria ser/quero eu que seja)... Editora, personagens, circulação de livros e arte.
Seguem abaixo minhas respostas:
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EDITORA Ser escritor é algo estúpido. Muitos acham que ser produtor de histórias é algo inteiramente bom. Não é assim, infelizmente. Primeiro que escritor não é considerado uma profissão, já tentei e argumentei em vários lugares, mas não adianta, não está na lei. Certa vez estava recitando uma poesia em frente ao Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, para ver se conseguia chamar a atenção do público para dar uma olhada em meus livros, e quem sabe, comprar. Sabe o que ouvi? Uma mulher passou por mim e disse quase num resmungo: - Vai trabalhar vagabundo. Outra vez cheguei a Fortaleza, onde ia participar de um debate sobre Cultura. Na recepção do hotel tive que preencher uma ficha. Num espaço pediam a minha profissão, e lá coloquei todo orgulhoso: Escritor. Após entregar a ficha ao funcionário, aguardava ansioso a chave do meu quarto, precisava de um banho. Mas o atendente examinava a ficha e olhava pra mim com cara de desconfiado. Perguntei se tinha algo de errado e ele disse: O senhor não tem profissão? Por isso, quando muitas vezes alguém diz pra mim que é escritor eu digo em pensamento: - Grande coisa. A firma que o escritor trabalha é conhecida pelo nome de Editora. Geralmente essa firma recebe a produção de um escritor, analisa, e se for bom e propício para aquele momento, a editora paga uma pequena porcentagem ao autor. Isso, se o produto der certo no mercado. Mas o produtor das histórias não tem os benefícios de um trabalhador. Queria eu que as editoras funcionassem de fato como uma empresa que tem compromissos trabalhistas com seu funcionário. Ah, como seria bom ter um salário mensal, férias, décimo terceiro, FGTS, aposentadoria, cesta básica, folga e ser considerado um verdadeiro trabalhador. Acho que pelo menos assim seríamos considerados pessoas que têm uma profissão.
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PERSONAGEM Até hoje, de todos os personagens que criei em minhas histórias, não gostaria de ser nenhum deles. Tudo porque sempre coloco raiva quando invento um personagem. Meus conflitos viram pessoas literárias e sinto-me aliviado quando vejo uma criação andar sem mim. Isso porque às vezes o ódio é tanto que a ficção aprende a andar sozinha. Em alguns momentos chego a ter dó dos meus personagens pela vida que levam. São tantos “não” e “tropeços”, tantos pensamentos medíocres e idéias estranhas que tenho medo de que isso tudo seja do meu inconsciente. Afirmo o tempo todo que não é, para eu mesmo tentar acreditar. Falo que isso é criação mentirosa e que todo escritor é um bom mentiroso. Mente tão bem que faz leitor chorar, rir, se corroer por dentro, sentir dor, ir pra frente ou voltar pra trás. Acho que sempre judiei dos meus leitores quando se fala em personagem. Mas ainda tento criar um personagem diferente, um apenas, mas que esse um faça um grande estrago em quem conhecê-lo. Um personagem que arranque do leitor lágrimas de sangue, que acelere o seu coração, que perturbe os pensamentos, que faça guerra na paz, que faça um furacão por dentro, enfim, que traga tudo de ruim para o leitor, mas que ao fechar o livro, esse leitor seja e esteja uma pessoa melhor do que no início da leitura. Ainda sonho com esse personagem, só quando eu conseguir criá-lo é que estarei em paz comigo mesmo.
______________________________________________ CIRCULAÇÃO DE LIVROS Tenho cá comigo que o livro deveria ser de todos. Não adianta virem com o discurso demagógico de que todos têm acesso a esse objeto. Mentira. Os livros ainda não chegaram onde têm que chegar. Isso é mérito somente da coca-cola e da televisão. Penso, sou a favor e mexo-me para que os livros de literatura cheguem aos bares, igrejas, hospitais, bairros, favelas e zonas rurais. Todos têm direito a ler livros, sejam eles emprestados, comprados e até roubados. Sim, seria tão divertido ter pessoas que roubassem livros para benefícios próprios de enriquecimento mental. Na verdade não seria roubo, apenas desvio. Dessa forma os livros iriam realmente circular. Mas isso ainda está longe de acontecer, é só se perguntar: Se numa mesma rua tombam dois caminhões, um de cerveja e outro de livros, qual será o caminhão que as pessoas vão atrás?
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ARTE A arte é vida e morte ao mesmo tempo. É você tentar se encontrar e se perder no mesmo lugar e nas mesmas circunstâncias. Sempre carreguei comigo a idéia de que a arte é uma extensão de meu corpo e do meu pensamento. Sem ela talvez eu fosse um mero ser humano batendo cartão numa empresa de segunda a domingo, o dia inteiro, folgando uma vez por semana, jogando futebol, bebendo no bar da vila, pai de uns cinco ou sete filhos, brigando com a mulher e assistindo televisão, todo acomodado. Hoje sou o contrário disso tudo, mas confesso que às vezes seria melhor ser mesmo um assalariado acomodado e cheio de filhos. Com a arte eu me descubro a cada dia e fico com medo de quem eu sou e do que eu sou capaz. Sem a arte eu era muito mais sensível, mais ser humano e mais comum. Quando passei a ser e viver arte meu coração esfriou. Passo em frente a um mendigo caído ao chão e essa cena já não me comove mais. Antes eu nem ligava para os demônios que moram em minha mente, hoje já sofro com eles e tento exterminá-los a cada palavra escrita ou lida. Depois que a arte passou a ser uma extensão de meu corpo, fiquei com mais medo da vida, das pessoas e de mim mesmo. Morro de medo de ficar sozinho ou de ser trancado em um quarto escuro, abafado e sem janelas e portas. A arte me ensinou que as pessoas que sabem menos das coisas, sabem muito mais que eu.